Penso que é da maior importância uma vigilância constante. O hábito é tanto mais perigoso que se infiltra sem quase se dar por isso.
Há pequenas coisas que se podem fazer e que são uma sacudidela na vida de todos os dias.
Quando o Nuno está no Atelier, às vezes à noite, e eu em casa – um telefonema dum de nós ao outro só para dizer que o ama. Claro que tem de ser sentido. Mas muitas vezes sentimos e não dizemos nada. Por vezes há a tentação de pensar: que ridículo, ir agora dizer-lhe isto… Para quê?, etc. No entanto, penso que todos nós, quando noivos, não nos importávamos de ser ridículos. Uma vez convidei o Nuno, por escrito – com V. Exª. e tudo – para irmos jantar fora (pois havia muito tempo que não o fazíamos e por mais lamirés que eu desse, nada). E foi um jantar cheio de novidade. Umas flores que o Nuno de vez em quando me traz, especialmente fora dos dias especiais (anos, etc.). O vestido novo que ele sempre nota e que eu procuro sempre estrear com ele. Um livro que o Nuno me oferece, especialmente aquele em que eu falei em tempos e de que ele tomou nota. (…)
Lembro aqui uma grande carta que escrevi ao Nuno, numa altura em que reconheci o perigo do hábito e da instalação a rondar-nos. Fui pô-la lá em baixo na caixa do correio. Esta foi uma grande sacudidela. (…)
Natália
Considero que o hábito representa um grande perigo e uma ameaça constante para o amor, pois pode abafá-lo. Temo-nos defendido bastante desse perigo, porque a Natália desde o princípio que tem uma aguda consciência dele, falando disso mesmo antes do nosso casamento. Por isso, temos procurado não abdicar de uma parte da nossa intimidade pessoal e de um certo recato em relação um ao outro. Ao mesmo tempo, temos procurado afastar a ideia de uma posse definitiva [de] um pelo outro, tendo insistido também muito a Natália na necessidade de nos conquistarmos sempre de novo. (…)
Nuno