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Cooperativa Pragma (1964-1972)

A Pragma foi fundada por um grupo de católicos, em Abril de 1964, como uma «Cooperativa de Difusão Cultural e Acção Comunitária». Porquê uma cooperativa? Porque foi a forma de tirar o partido possível de uma lacuna legislativa: as cooperativas não tinham sido abrangidas pelas limitações impostas ao direito de associação e, por essa razão, nem os seus estatutos eram sujeitos a aprovação legal, nem a eleição dos seus dirigentes a ratificação pelas entidades governamentais.

Desde o seu núcleo inicial, não se restringiu ao universo «intelectual» e incluiu também sócios provenientes do meio operário, nomeadamente dirigentes e militantes das organizações operárias da Acção Católica. Os horizontes abriram-se rapidamente e muitos dos seus futuros membros nem sequer eram católicos.

Subjacente a este novo projecto estava, obviamente, um posicionamento de oposição ao regime como um todo, à falta de liberdades, à guerra de África. Pretendeu­‑se explorar mais uma janela legal de oportunidades, complementar outras iniciativas, criar possibilidades para acções concretas e úteis, aumentar a consciência política e social de um número cada vez maior de pessoas.

Os Estatutos definiram como objecto da Cooperativa: «a) – Facultar aos seus sócios a maior defesa económica nos artigos que possam adquirir ou produzir; b) – Promover o aperfeiçoamento moral, cultural e técnico dos sócios e suas famílias […]; c) – Instalar casas de férias para sócios e famílias».

A PIDE esteve atenta à Pragma desde o início e a sua sede acabou por ser encerrada em 6 de Abril de 1967, antes da terceira sessão de um ciclo dedicado ao problema da emigração, e os elementos da direcção foram detidos. Enviaram-se abaixo-assinados de protesto com centenas de assinaturas ao Presidente da República e aos Bispos Portugueses, sem qualquer sucesso, e a verdade é que a acção da Cooperativa, sem a sua sede, foi cada vez mais difícil por depender da cedência de salas por várias entidades, com a PIDE a proibir quase todas as sessões.

Paralelamente, deu­‑se início a um longo processo de contestação do encerramento da sede, que incluiu um recurso para o Supremo Tribunal Administrativo. Este viria a tomar uma posição favorável à Cooperativa, em Julho de 1968, embora essa decisão não tenha tido quaisquer efeitos práticos. Mas a Pragma nunca foi extinta.

Nuno Teotónio Pereira e a Pragma

Por razões tácticas, Mário Murteira foi o sócio nº 1 e o primeiro presidente da direcção. Nuno Teotónio Pereira, sócio nº 2, foi o segundo presidente e, sem qualquer espécie de dúvida, o principal animador desse  projecto de criação da Cooperativa até ao fim das suas actividades.

Exposição organizada pela Pragma sobre planeamento económico e progresso social (Abril 1965)

No dia em que uma brigada da PIDE e o subdirector Sachetti invadiram a sede e a selaram, o Nuno seguiu com os agentes para a sede daquela polícia – de táxi – e foi mais tarde levado para a prisão de Caxias. Os outros elementos da direcção foram detidos no dia seguinte e todos libertados quatro dias depois.

Seguiram-se tempos muito difíceis, como já referi na primeira parte deste texto, sempre, mas sempre, com a liderança pacífica e com uma perseverança inabalável do Nuno. Para além dos resultados visíveis destas suas características, ele foi para nós todos os que com ele colaborámos, um verdadeiro mestre de vida e de aprendizagem de militância e resistência. Marcou-nos para sempre, nunca a nossa gratidão será suficientemente forte para o que representou.

Joana Lopes
Novembro de 2021

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