Quatro mulheres com filhos pequenos – Ivone Leal, Teresa Almeida, Teresa Carvalho, Sofia Maya Santos – lançaram em 1956, após dois anos de intensa preparação, a escola Os Castores, pensada para trabalhar com classes infantis. Até 1959 funcionou em Santo Amaro de Oeiras, tendo nesse ano mudado para Lisboa, onde se foi desenvolvendo em três locais sucessivos (Travessa da Fábrica das Sedas, Rua de São Bento e Rua do Poço dos Negros). Começou com sete crianças e quando terminou, em 1968, tinha alunos/as desde a pré-primária até à então 4ªclasse. A diretora dos Castores – e a sua grande animadora – foi Ivone Leal, mãe de seis filhos que todos eles frequentaram a escola.
Os mais novos trabalhavam por “centros de interesses”, articulados com educação de movimentos, exercícios de vida prática e exercícios sensoriais. Os da primária aprendiam a ler pelo “método global”. Todos tinham educação musical, educação plástica, educação física, inglês e educação religiosa. Havia visitas de estudo regulares e festas em certos momentos do ano participadas pelas famílias. Junto da escola foram criados um Gabinete de Observação e Correção Psicológica e um Gabinete de Estudo e Experimentação Pedagógica – o primeiro dedicado a identificar sinais de inadaptação ou de pequenos problemas motores ou de linguagem e a apoiar os alunos e alunas nessas situações, o segundo responsável pela orientação pedagógica da escola. Todo o mobiliário foi concebido de raiz para as crianças e todos os materiais eram criados pelas professoras. Havia reuniões periódicas de pais, que incluíam a discussão de temas sugeridos por estes, como, por exemplo, as “birras” ou “a educação sexual nas crianças dos 3 aos 7 anos”. As famílias podiam optar por utilizar um transporte organizado pela escola, assim como pelo almoço preparado pela cozinheira ou enviar a refeição de casa. A escola procurava integrar crianças com necessidades educativas especiais no funcionamento normal das diferentes classes. Embora frequentada maioritariamente por crianças oriundas de famílias da classe média e média-alta, Os Castores adotou medidas para que crianças de meios sociais mais baixos a pudessem também frequentar.
Num quadro formatado pela rigidez e completa inadequação do ensino oficial e da maioria do ensino privado aos novos desafios e correntes pedagógicas da segunda metade do século XX, a escola Os Castores foi, entre 1956 e 1968, um exemplo do que pode conseguir a vontade de “fazer diferente” e fazer com sentido.
Para manter estas condições por uma mensalidade comportável, os problemas financeiros foram constantes. Em 1968 a direção da escola decidiu fechá-la, atendendo a que “as animadoras do projeto estavam cansadas de lutar. Também contra o Ministério e a Mocidade Portuguesa. À revelia do primeiro mantínhamos a coeducação na primária. Contrariamente à segunda, não abríamos a escola ao sábado para pôr as meninas a fazer enxovais luxuosos para os pobrezinhos, enquanto os rapazes marchassem no pátio desafinando A Portuguesa e o hino da Mocidade. Ou mudávamos a escola ou terminávamos a atividade. Alterar a teoria e a prática da escola era rendermo-nos à tirania do ‘vil metal’ e deixar de sonhar. Mas como viver sem sonhar? Fechámos a escola e continuámos a sonhar!” (LEAL, Ivone. Os Castores: um exemplo de como se passa do sonho à realidade: 1954-1968, Lisboa: 2004).
Os três filhos da Natália e do Nuno passaram por esta escola, a mais velha desde o ano letivo 1957-1958. Em 1959, perante a perspetiva de a escola ter de fechar por razões financeiras, um grupo de pais decidiu contribuir com um empréstimo, de acordo com as possibilidades de cada casal, passando a ser considerados “pais-sócios” e a estarem associados de forma mais próxima à direção da escola. Foi o caso do Nuno e da Natália, cuja participação cessou em 1965 quando decidiram mudar a filha mais nova de escola.
Luísa Teotónio Pereira e João Leal
Dezembro de 2021
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