Apesar de, por motivos táticos, o Nuno não figurar na lista dos primeiros membros do GEDOC – Grupos de Estudo e Intercâmbio de Documentação, Informações e Experiências, foi preso no seguimento de uma rusga policial à Tipografia Leandro, onde se imprimiam os “Cadernos GEDOC”, cujo nº 10 foi na altura apreendido.
As circulares nºs 3 e 4 da CNSPP noticiam esta e mais três prisões relacionadas: a de Manuel Mourão (9 de abril ), a do P. José da Felicidade Alves (19 de maio) – o promotor deste movimento – depois de uma minuciosa busca à sua casa que durou 7 horas, e a do P. Abílio Tavares Cardoso (16 de junho). Os quatro foram libertados ao fim de poucos dias, cada um mediante uma caução de 10.000$00. Remetido o processo ao tribunal pela polícia política a 2 de junho, o Ministério Público devolveu-o, solicitando investigações complementares. Dezenas de outras pessoas foram então inquiridas pela Direção Geral de Segurança, incluindo a Natália, que estava com uma gravidez de risco, e por isso foi interrogada em casa, no dia 15 de janeiro de 1971.
O julgamento teve lugar a 6 de novembro de 1973 no Tribunal Plenário de Lisboa. O Nuno declarou nessa altura: “É a primeira vez que me sento neste tribunal. E as minhas primeiras palavras são para aqueles que aqui se sentaram antes, vindos de diversas correntes políticas, mas tendo uma coisa em comum: o amor pelo povo português – para muitos deles um amor que foi até à entrega da própria vida”. (…)
Os promotores e aderentes dos grupos GEDOC nunca visaram a criação duma associação ou de qualquer entidade jurídica equivalente. Perante o fracasso das instituições, apostaram na riqueza de um movimento informal, com uma direcção definida mas sem metas pré-estabelecidas, decididamente voltado para a busca e para a experiência, sem estatutos, sem estrutura organizada, sem dirigentes encartados.
Isto poderia ter-se feito assim para escapar às malhas de uma legislação injusta e implacável. Mas não foi: isto fez-se assim porque se acreditava que, em face da problemática do momento, se julgou este método mais rico e mais adequado. De instituições estamos todos fartos: era preciso dar lugar à imaginação criadora, à busca de novos caminhos, à possibilidade dos crentes e dos cidadãos se encontrarem, livres de todas as peias: só assim seria possível reencontrar a frescura da fé, rasgar novos horizontes, para se encontrarem as vias de fazer novas todas as coisas.
Já foi aqui dito que o movimento GEDOC foi um momento forte de esperança; e que esse momento foi sufocado. Mas é preciso dizer que não foi um momento isolado: ele insere-se numa linha, que já vinha de trás. Nem fomos os primeiros nem os últimos. E essa linha, temporariamente submersa, continua, para lá de todas as repressões, tanto eclesiásticas, como civis: não é preciso ter os olhos muito abertos para ver que prossegue o seu caminho.” (…)
“Mas sou acusado de um outro crime: o de ter posto a circular informações que, à face do critério oficial, são tidas por falsas e tendenciosas. O mesmo critério oficial que diariamente impede os portugueses de se inteirarem dos problemas do país, manipulando a informação e condicionando assim a consciência dos cidadãos.
É um poder assim, manchado por meio século deste pecado hediondo, que vem acusar alguns de nós por termos tentado romper o véu da mentira, fazendo circular meia dúzia de verdades. Se a circulação destas verdades é crime à face da lei, é essa lei que verdadeiramente está a ser julgada aqui.” (…) (PEREIRA, Nuno Teotónio. Depoimento no Tribunal Plenário no processo GEDOC. Lisboa: documento dactilografado, 1973).
A sentença foi conhecida no dia 15 de Novembro de 1973: os quatro réus foram absolvidos das acusações de “associação ilegal” e de “incitamento à desobediência colectiva”.
Nove dias depois, o Nuno foi preso pela 4ª e última vez.
CONTEÚDOS RELACIONADOS
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Ver Testemunho de José Alberto Franco