Atividade política Igreja católica

Co-organiza a Vigília da Capela do Rato, em Lisboa (30-31 dezembro)

1970

Atividade política
É preso pela segunda vez, no âmbito do processo dos Cadernos GEDOC (27-29 maio)
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1971

Assuntos pessoais
Falecimento da sua mulher Natália e da quarta filha, Catarina, em Lisboa (23 abril)
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1972

Atividade política
É co-fundador do BAC – Boletim Anti-Colonial (outubro)
 
Atividade política Igreja católica
Co-organiza a Vigília da Capela do Rato, em Lisboa (30-31 dezembro)
 
Atividade política
É preso pela terceira vez, com o filho Miguel e outras 12 pessoas, presentes na Capela do Rato (31 dezembro-12 janeiro 1973)
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1973

Atividade política
É preso pela quarta vez, ao mesmo tempo que outros elementos do grupo do BAC (24 novembro-27 abril 1974)
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1974

Atividade política
É libertado da prisão de Caxias, com todos os outros presos políticos (27 abril)
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O que aconteceu nos dois últimos dias do ano de 1972 nesta capela foi já descrito por vários dos seus organizadores e participantes. Um “abalo sísmico” tem razões, antecedentes, e cria réplicas.

No dia 1 de janeiro de 1969 houve uma primeira vigília, em Lisboa, na igreja de S. Domingos. A 8 de janeiro a Vigaria Geral do Patriarcado publicou uma Nota. No dia seguinte os “animadores da velada” divulgaram a mesma Nota corrigida (entre parêntesis retos): “Na noite da passagem do ano, um grupo de jovens [e adultos], depois da missa pela Paz celebrada por sua Eminência o Senhor Cardeal Patriarca na igreja de S. Domingos, permaneceu nessa igreja até cerca das 6 horas, numa vigília em que houve cânticos, leituras e comentários. Alguns animadores [delegados] do grupo, informado o senhor Cardeal Patriarca que se tratava de um tempo de [reflexão e] oração pela Paz, obtiveram autorização para essa permanência.
O carácter tendencioso da reunião foi-se, porém, revelando ao longo dela e acabou por ser publicamente confirmado por um manifesto distribuído, em que se contestava a Nota Pastoral do Episcopado sobre o Dia da Paz, nomeadamente por nela não se condenar a política ultramarina do Governo Português. A presença activa do Revº. Pároco conseguiu um mínimo desejável de ordem, cortando a tempo as expressões de carácter mais dúbio. [Esta autorização foi dada com base na leitura dum documento explicativo, posteriormente distribuído à assembleia onde, entre outros pontos, se contestava o carácter tendencioso da Nota Pastoral do Episcopado sobre o Dia da Paz, embora não se exigisse, de modo algum, que esta condenasse a política ultramarina do Governo Português. A presença activa do Revº. Pároco impediu que a reflexão se processasse no plano de profundidade e serenidade por todos desejado.]

Manifestações como esta que acabam por causar grave prejuízo à causa da Igreja e da verdadeira Paz, pelo clima de confusão, indisciplina e revolta que alimentam, são condenáveis; e é de lamentar que apareçam comprometidos com elas alguns membros do Clero que, por vocação e missão, deveriam ser, não os contestadores da palavra dos seus Bispos, mas os seus leais transmissores.” [Manifestações como esta, que prestam um grande serviço à causa da Igreja e da verdadeira Paz, pelo clima de esclarecimento, responsabilização e empenhamento que alimentam, são desejáveis, e é de louvar que apareçam comprometidos com elas alguns membros do Clero, a cuja vocação e missão não repugna que contestem a palavra dos seus Bispos, já que não são os seus servis transmissores]”. (Católicos e política: de Humberto Delgado a Marcello Caetano. Padre José da Felicidade Alves (edição e apresentação), 1969).

No início de 1973, os acontecimentos da Capela do Rato sobressaltaram várias sessões da Assembleia Nacional (15, 16, 17, 23 e 24 de janeiro e 6 de fevereiro). O deputado Casal- Ribeiro tomou a iniciativa ao condenar no dia 15 a organização da vigília, considerando-a uma ofensa às Forças Armadas, “cuja abnegada missão no Ultramar consiste em manter a integridade nacional”. No dia 23 o deputado Miller Guerra respondeu-lhe:

Como pode a Igreja ser livre num Estado que coarta a liberdade de pensamento e de expressão? Os acontecimentos da Capela do Rato, que fizeram estremecer a consciência de numerosos católicos e não católicos, responderam à pergunta. (…) É aqui, nesta terra glorificada pela fidelidade à Igreja, que, no dia 31 de dezembro, os católicos reunidos numa capela para discutirem a justiça, a paz e a guerra são expulsos do templo… (…)
Casal-Ribeiro: Eu estava a perguntar a V. Ex.ª se acha bem e se concorda que na Igreja, ou em qualquer outro sítio, se discutisse ou se discuta a legitimidade da presença de Portugal no Ultramar.
Miller Guerra: Ora aí está uma pergunta objetiva e concreta e a que eu respondo também objetiva e concretamente: Acho, sim senhor. Não só na Igreja, como em qualquer outra parte.

A 6 de fevereiro, Miller Guerra voltou ao debate: “No dia 23 de janeiro último fiz uma intervenção subordinada ao título «Os acontecimentos da capela do Rato»”, de que provavelmente VV. Exas. não se esqueceram.
Henrique Tenreiro: Muito tristemente!
Miller Guerra: Os jornais e a rádio foram obrigados a dar a notícia de tal modo que o público ficou com curiosidade de saber o que verdadeiramente se passara. O Governo quis que o País fosse mal informado. E foi. (…) A minha intervenção focava um ponto nevrálgico da vida nacional: a liberdade de palavra e de reunião sobre uma matéria que preocupa justificadamente o povo português – a paz. Defendi, e continuo a defender, que qualquer assunto deve ser apreciado e discutido por todos aqueles a quem diz respeito.
Vozes: Não apoiado! Não apoiado!
Miller Guerra: Levantei a questão a propósito dos católicos, mas pode e deve levantar-se para os adeptos de todas as crenças religiosas, ideologias políticas ou correntes de opinião. A paz, a verdadeira paz é fruto da liberdade dos cidadãos, e de forma nenhuma o resultado da política imposta pelo grupo que está no Poder.
(Muitas vozes discordantes interrompendo o orador)”. (Diário da Assembleia da República)

O debate prosseguiu até que Miller Guerra anunciou o seu pedido de renúncia ao mandato.


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