74 participantes (incluindo 6 crianças) acorreram ao largo da igreja de Galegos na manhã de 27 de março de 2022 para o início da Evocação da passagem da fronteira: uma experiência de resistência ao fascismo e à guerra colonial (1970), organizada no quadro do centenário do nascimento de Nuno Teotónio Pereira.
Presença forte e calorosa de tantos amigos do Nuno, muitos dos quais já não se viam há anos, e que ali testemunharam o respeito e a gratidão pelo homem que, precisamente há 52 anos atrás, proporcionou as condições para a bem sucedida deserção e fuga para a Europa de dois oficiais milicianos, Joel Pinto e Fernando Venâncio, então mobilizados para a guerra colonial na Guiné.
O Tiago Teotónio Pereira, neto do Nuno e falando em nome da família, deu as boas vindas aos participantes e anunciou as linhas gerais do evento. Os Presidentes da Câmara e da Assembleia Municipal de Marvão, respetivamente Luís Vitorino e Jorge Lourenço Marques, proferiram palavras de acolhimento institucional e relevaram a atualidade do testemunho político do Nuno Teotónio Pereira.
As três horas seguintes foram ocupadas, sob a orientação experimentada do António Garraio, na reprodução abreviada da rota pedestre que os 2 desertores e os seus 8 acompanhantes percorreram em 27 de março de 1970 até à aldeia espanhola da Fontañera (onde o Joel e o Fernando ficaram escondidos), e no regresso dos restantes a Galegos, pelos trilhos habitualmente utilizados pelos contrabandistas da zona.
Durante as paragens do percurso, tivemos ocasião de ouvir marcantes testemunhos do Joel Pinto, do Fernando Venâncio e do José Alberto Franco, e ainda do cabo-chefe Simão (agora aposentado, mas que à época chefiava o posto de Marvão da GNR). Da parte de todos, o registo emocionado do que para os acontecimentos significou a personalidade do Nuno Teotónio Pereira, e a sua enorme generosidade e coragem.
Quando da paragem na Fontañera, tivemos oportunidade de um reconfortante apoio alimentar e aí tirámos uma grande fotografia dos participantes. Nas redondezas, onde foi obtida uma foto do grupo de 1970, tirou-se agora a sua imagem atualizada de 2022.
Sendo a iniciativa fronteiriça, houve participantes de ambos os lados e o jornal El Diario também fez a sua reportagem.
Num texto muito inspirado de Carlos Ribeiro acerca deste evento [no qual se podem ver muitas outras fotos], diz-se que “os momentos de entusiasmo coletivo foram vários e as histórias para contar, intermináveis. Se tivéssemos o condão da Blimunda de Saramago, a tal das Sete Luas, que no Memorial do Convento fazia recolha de vontades para criar energia para a passarola voar, teríamos neste encontro de “mulheres e homens de boa vontade” um relançar de esperança num ativismo de generosidade e de humanismo militante. Isto porque as intervenções (…) sobre a deserção e a recusa da guerra colonial relembraram-nos a importância dos Bartolomeus Lourenços de Gusmão no apelo rebelde para voarmos, voarmos como ato de criação e de coragem. E sabemos que, no seu discreto quotidiano, Nuno Teotónio Pereira construía… passarolas” (“Sem fronteiras”, 28/3/2022).
José Alberto Franco
2 Abril de 2022
CONTEÚDOS RELACIONADOS
– Evocação da passagem da fronteira
– Uma experiência de resistência ao fascismo e à guerra colonial