PALMA DE MELO – UM TESTEMUNHO
Há arquitectos de cuja obra se pode falar com apreço e admiração sem atendermos às características da sua personalidade ou até sem conhecermos a pessoa. Não é o meu caso em relação a Cândido Palma de Melo. Originários ambos de boa cepa de 22, colegas na antiga Escola (ainda não superior) de Belas Artes, temos percursos profissionais distintos, ainda que com coincidências, mas mantendo ao longo da vida uma amizade e cumplicidade constantes. Desde os momentos altos da vida associativa até aos breves encontros de rua, estar com o Palma é sempre uma ocasião de alegre camaradagem. E como desde sempre tenho verificado que isto não sucede apenas comigo, apenas posso concluir que o motivo de tal acontecer está nele – na sua afectividade jovial, no seu optimismo invencível, na sua generosidade a toda a prova. E estes traços do seu carácter não podem deixar de revelar-se no seu trabalho.
Discípulo de Keil do Amaral e companheiro de atelier durante décadas de Artur Pires Martins – referências de primeiro plano em termos de talento, ética profissional e estudo consciencioso dos projectos – Palma de Melo tem sabido conjugar tudo isso com notável constância. Atento às questões formais sem as quais não há arquitectura, acredito que nunca deixa de se preocupar com os utentes, com aqueles que irão utilizar os espaços que lhe vai cabendo conceber e construir – enfim, com as pessoas. Atento por isso às especificações de cada programa, aquilo a que a nossa geração chamava exigências funcionais e que hoje estão um tanto fora de moda a favor de uma por vezes obsessiva procura de formas.
É neste quadro que encontra lugar o importante papel de Palma de Melo na introdução em Portugal de normas tendentes à universalidade de direitos de mobilidade no espaço construído. Ao longo dos anos, este arquitecto, quer através de propostas regulamentares, quer por uma acção persistente de sensibilização dos colegas, não deixou de lutar para que aquele objectivo fosse conseguido. E se razões familiares poderão ter sido o impulso inicial desta acção, atrevo-me a a dizer que a alimentá-la constantemente tem estado o seu “espírito casapiano”. Afinal, ainda o mesmo interesse pelas pessoas e pelos direitos de todos.
Se a isto faço referência é porque, não só a homenagem que se presta a Palma de Melo tem por quadro o seu interessante trabalho para o Centro de Apoio Comunitário – e por isso vem a propósito – mas também porque tive ocasião de encontrar pela vida fora alguns outros casapianos de que recebi lições de comportamento e camaradagem que a memória não deixa apagar.
PEREIRA, Nuno Teotónio. “Palma de Melo: um testemunho”. Original impresso, out. 2000, 2 p.
Por ocasião da exposição sobre o arquitecto Cândido Palma de Melo
CÂNDIDO PALMA TEIXEIRA DE MELO (1922-2003). Arquiteto.
– Arte com H