PACHECO, Duarte (Loulé, 1900-1943)
Nascido em Loulé em 1900, morreu tragicamente em 1943 quando o seu carro se despistou perto de Vendas Novas, quando vinha para uma reunião do Conselho de Ministros depois de ter visitado obras em Vila Viçosa. Dotado de superior inteligência, de uma grande capacidade de trabalho e de notável poder de decisão, foi o grande impulsionador da política de Obras Públicas levada a efeito pelo Estado Novo.
Desde cedo se revelou o seu interesse pela política quando se alistou no batalhão académico que se formou em Janeiro de 1919 para combater os revoltosos monárquicos entrincheirados em Monsanto.
Formado em engenharia electrotécnica pelo Instituto Superior Técnico em 1923, onde se distinguiu enquanto estudante, foi nomeado seu professor dois anos mais tarde, ao mesmo tempo que é designado director interino do Instituto. Em 1927 passa a director efectivo e nesse mesmo ano inicia as diligências para a construção de um novo edifício no Arco-do-Cego, já que o velho casarão da Boavista era de todo acanhado e obsoleto.
Estava-se então nos primeiros anos da Ditadura Militar iniciada com o Movimento de 28 de Maio e Duarte Pacheco fazia parte da União Liberal Republicana de Cunha Leal. Em 1928 é convidado para ministro da Instrução Pública no governo do general Vicente de Freitas, tendo-se deslocado a Coimbra para convencer Oliveira Salazar a ocupar a pasta das Finanças.
Como ministro da Instrução, lugar que ocupa por escassos meses, devido à instabilidade governativa que caracterizou aquele período, regulamentou o ensino liceal, organizou o artístico e remodelou o universitário. Volta ao Técnico como director, tendo ocasião de concretizar o projecto, entregue ao arquitecto Pardal Monteiro, das novas instalações do Instituto, conjunto monumental que marca o arranque do período das grandes obras públicas.
Em Julho de 1932 Salazar forma o seu primeiro governo e cria o Ministério das Obras Públicas e Comunicações, convidando Duarte Pacheco para preencher o lugar. É a partir daí que começa verdadeiramente a sua fulgurante carreira de estadista. Dotado o Ministério das verbas necessárias devido ao programa de saneamento financeiro realizado por Salazar, logo Duarte Pacheco lança em simultâneo um vasto conjunto de obras: os edifícios da Casa da Moeda e da Estatística, o aeroporto de Lisboa, o Parque florestal de Monsanto, a estrada marginal para Cascais, o Estádio Nacional e a respectiva auto-estrada, de que o viaduto que tem o seu nome é obra emblemática, liceus e escolas por todo o País, obras portuárias e nos monumentos nacionais, rede viária, etc. Para tudo isto recorreu a processos expeditos e expropriou terrenos ao abrigo de legislação especial, o que lhe valeu a oposição de muitos apaniguados do regime, que fizeram pressão junto de Salazar para o demitir, o que conseguiram em 18 de Janeiro de 1936. Nesse dia, um jantar reunindo centenas de pessoas ligadas aos meios empresariais de Lisboa celebrou o acontecimento. O passado republicano de Duarte Pacheco não lhe proporcionou a necessária imunidade para convencer o Presidente do Conselho a mantê-lo no lugar.
Efectivamente, pode dizer-se que Pacheco não era um fiel do Estado Novo: mais do que servir o regime, serviu-e dele para realizar a sua obra. Não se conhece nenhuma fotografia em que esteja a fazer a saudação fascista do braço estendido, quando outros membros do governo e o próprio Salazar a fazem.
Mas aproximavam-se as celebrações do duplo centenário de 1939-40 e o ditador não prescindia dos seus serviços.
É assim que é nomeado em Janeiro de 1938 para a presidência da Câmara de Lisboa e logo em Maio novamente para o governo, acumulando estes dois cargos. Lança-se então na grande tarefa de tornar Lisboa digna de ser capital do Império.
Em primeiro lugar encarrega o urbanista Etienne de Groër de traçar o Plano de Urbanização e de Expansão de Lisboa, trabalho que viria a orientar todas as obras na capital e muito especialmente o processo de expropriação sistemática de terrenos que abrangem um terço do território de Lisboa e de que ainda hoje se colhem os benefícios. Logo a seguir vem o Plano de Urbanização da Costa do Sol, com a criação de um Gabinete próprio, e depois o plano de reabilitação e valorização da zona marginal de Belém envolvendo a encosta do Restelo. O novo abastecimento de água a Lisboa a partir das lezírias do Tejo e coroado simbolicamente com a fonte monumental na Alameda Afonso Henriques deve-se também ao seu impulso. Prolonga-se a avenida Almirante Reis até à Praça do Areeiro, para a qual Cristino da Silva projecta um conjunto de edifícios com fachadas inspiradas no século XVIII, que vem a constituir o modelo para o chamdo «português suave», estilo com o que o Estado Novo , a partir de 1940, marcou a sua arquitectura. É neste ano que se realiza a grandiosa Exposição do Mundo Português, sob a orientação dinâmica do Ministro.
Para ladear a tradicional lentidão da máquina burocrática do Estado, Duarte Pacheco criou uma série de comissões de obras e delegações dedicadas a sectores específicos: construções hospitalares, novas instalações da Caixa Geral dos Depósitos e dos CTT, construções prisionais, construções escolares e universitárias, novos quartéis, etc. Os respectivos responsáveis não dependiam da orgânica do Ministério e despachavam directamente com o Ministro. É assim que se explica que num prazo tão curto de cinco anos tenham sido lançadas inumeráveis obras por todo o País. Trabalhava sem descanso até altas horas da noite recebendo um a um os seus colaboradores que saiam destas sessões extenuados.
Na sua acção, Duarte Pacheco teve papel de relevo na rivalidade que opunha então arquitectos e engenheiros para a encomenda de projectos. Com a sua clarividência, demarcou com nitidez os papéis de cada profissão, contribuindo para conferir aos arquitectos um prestígio social e cultural de que não dispunham anteriormente.
Não obstante a sua formação eminentemente técnica, foi um dos impulsionadores de uma pretensa arquitectura nacional, que veio interromper o percurso do Movimento Moderno em Portugal, obrigando a que nas encomendas do Estado fossem seguidos cânones considerados de carácter português, e que se afirmaram nocivos para a evolução da Arquitectura no nosso País. Exemplos significativos deste modelo são os prédios de rendimento das avenidas António Augusto de Aguiar e Sidónio Pais, construídos por sua inspiração.
A atestar a vastidão da sua obra foi realizada já após a sua morte a Exposição «Quinze Anos de Obras Públicas», da qual foi publicado um livro chamado «de Ouro». As Obras Públicas foram assim uma das imagens de marca do Estado Novo, resultado da prodigiosa actividade de Duarte Pacheco, que desde muito novo se impôs pelas suas invulgares qualidades de homem de acção.
Bibliografia:
FERREIRA, Vítor Matias – A cidade de Lisboa: de capital do Império a centro da Metrópole. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1987
FRANÇA, José Augusto – A arte em Portugal no século XX. Lisboa: Bertrand, 1974
GABINETE DE ESTUDOS OLISIPONENSES – Evocar Duarte Pacheco. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, 1993
GONÇALVES, Fernando – “Urbanística à Duarte Pacheco”. Arquitectura, nº 142 (Julho 1981)
LOBO, Margarida Souza – Planos de urbanização: a época de Duarte Pacheco. Porto: Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, 1995
MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS – 15 anos de obras públicas: 1932/1947, livro de ouro. Lisboa: Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, 1948
SILVA, Carlos Nunes – Política urbana em Lisboa, 1926/74. Lisbos: Livros Horizonte, 1994
PEREIRA, Nuno Teotónio. “Pacheco, Duarte”. BARRETO, António; MÓNICA, Maria Filomena (coord.). Dicionário da História de Portugal, vol. 9. Porto: Livraria Figueirinhas, 1999-2000, pp. 18-19
DUARTE JOSÉ PACHECO (1900-1943). Engenheiro eletrotécnico.