UMA OBRA EXEMPLAR
O conjunto de obras do Atelier Filipe Oliveira Dias construído no curto espaço de quinze anos constitui um marco assinalável no campo da Arquitectura no nosso país. Desde logo, pela sua qualidade e coerência, mas também pelo seu número e pelo facto de se tratar sobretudo de equipamentos públicos, com um forte e positivo impacto nos diferentes contextos urbanos em que se inserem.
Os quinze anos abrangidos por estes trabalhos e o facto de se tratar maioritariamente de encomendas do Estado, faz-nos irremediavelmente recuar mais de meio século e recordar a célebre exposição “Quinze Anos de Obras Públicas”, publicada em livro e realizada pelo governo de Salazar em 1948 para glorificar a arquitectura tradicionalista do Estado Novo, que ficou depois conhecida por “português suave”. Recorda-se que foi no contexto dessa exposição que o governo promoveu os Congressos Nacionais de Engenharia e Arquitectura, o último dos quais ficou na História pelo facto das novas gerações, lideradas por Keil do Amaral, em Lisboa, e pela ODAM, no Norte, terem repudiado os modelos oficiais que eram impostos permitindo retomar entre nós o curso, que fora interrompido, do Movimento Moderno. E é nesse curso, que foi capaz de integrar as várias tendências e influências que se manifestaram ao longo do último meio século, que as obras de Filipe Oliveira Dias se inscrevem, numa linguagem vigorosa mas contida, alheia tanto a minimalismos como a exibicionismos.
Neste conjunto de trabalhos salta à vista a importância da encomenda pública na garantia da qualidade em Arquitectura. Desde logo, pela presença, em geral marcante, que assume no espaço urbano. Mas também pela abrangência dos utentes, permitindo fazer sentir e viver a um universo muito alagado os benefícios de projectos concebidos e construídos com rigor e coerência. É neste sentido que podem considerar-se obras emblemáticas os teatros de Vila Real e Bragança, as Piscinas Municipais de Mirandela e o conjunto habitacional do Monte de S. João, muito justamente contemplado com o Prémio do Instituto Nacional de Habitação. E também, já noutro registo, o Teatro Helena Sá e Costa, onde a delicadeza de uma intervenção contemporânea soube respeitar e até valorizar a pré-existência. E ainda os numerosos edifícios dedicados ao Ensino, onde sucessivas gerações de jovens irão conviver com uma excelente Aquitectura.
O dinamismo bem controlado dos volumes, o uso oportuno da cor, o apuro na organização e tratamento dos interiores, o emprego criterioso dos materiais, as relações entre interior e exterior e o cuidado no agenciamento dos espaços envolventes são outros atributos que podem ser assinalados.
É neste sentido que se pode dizer ter esta obra um alcance exemplar e pedagógico muito importante, na altura em que se defende no nosso país o “Direito à Arquitectura”, não como um privilégio ocasional ou para alguns, mas como um direito permanente e para o maior número.
PEREIRA, Nuno Teotónio. “Uma obra exemplar”. Arquitectos, out. 2004.
Existe original impresso, 10 set. 2004, 2 p. Sobre o Atelier Filipe Oliveira Dias
FILIPE OLIVEIRA DIAS (1963-2014). Arquiteto.
– Entrevista na SIC Notícias a Bárbara Guimarães (2007)