Ao Nuno Teotónio Pereira
São os teus sonhos de betão que ainda nos acompanham
espalhados que estão pela tua cidade
preenchidos de pessoas e ideias
conheci-te nas amoreiras em 1956
junto às primeiras habitações que desenhaste
e que marcam ainda hoje o teu traço renovador
no cinzentismo de uma época que sempre desejámos vir a esquecer
depois vieram as tuas propostas para habitação social
as tuas intervenções na renovação da arte religiosa
o teu combate permanente pela liberdade agrilhoada
no obscurantismo de uma época onde a polícia política os tribunais plenários
a censura e as proibições nos votaram a um exílio clandestino
dentro da nossa própria cidade lamentavelmente sitiada
onde desfraldaste bandeiras muito concretas e necessárias
foi então numa madrugada redentora de abril
que tanto aguardávamos e pela qual tu tanto lutaste
que o povo saiu à rua sem medo e abriu as portas da liberdade
quis o mais dramático dos destinos encontrarem-te
aprisionado num dos ultrajantes presídios do regime derrubado
de onde foste libertado pela pressão popular
que nessa mesma noite cercou a prisão e não arredou pé
temos saudades tuas
Luis Macara
Janeiro de 2022